domingo, 14 de setembro de 2008

Pequenos pedaços...


de felicidade...


Definir felicidade não é tarefa das mais fáceis. Numa reportagem recente, exibida na TV, várias pessoas foram perguntadas sobre suas definições de felicidade. Como foram abordadas na rua de forma inesperada, quase todas precisaram de algum tempo para pensar, e terminaram respondendo algo em torno do dinheiro e de bens materiais.

Na música “Pão e Poesia” o cantor e compositor baiano Moraes Moreira deu a sua versão para o tema: “felicidade é uma cidade pequenina, é uma casinha, uma colina, qualquer lugar que se ilumina quando a gente quer amar”. Uma visão bucólica que pouco tem a ver com a felicidade que muitos perseguem nestes tempos de tecnologias sedutoras e de alegrias fugidias.

Mergulhando nas imagens que essa música sugere, vou direto à minha infância, na década de 1970. Ela foi privada de praticamente todas as aquisições tecnológicas que o Brasil já havia conquistado naquela época e que podem ser consideradas ultrapassadas, se comparadas com o que temos hoje.

A verdade é que até 1982 a minha cidade cidade natal (Boa Nova-BA) não possuía nem energia elétrica em horário integral (apenas das 18 horas às 23h30min, com a ajuda de uma usina termoelétrica) nem telefone. Fora isso, os l6 quilômetros que a separam da rodovia BR 116 (a Rio-Bahia) não eram asfaltados; e havia poucos carros e TVs (valvuladas e em preto e branco).

Pensando naquilo tudo com a bagagem que tenho hoje, ao 37 anos, diria que a felicidade estava bem mais ao alcance das mãos. Claro que não estou fazendo aqui uma comparação direta, uma vez que os tempos são outros e também porque a minha atual visão de mundo é muitíssimo mais ampla do que na infância. Penso apenas que lugares como aquele, se ainda resistiram incólumes, têm bem mais chance de abrigar a felicidade tão propagada pelos monges budistas: aquela advinda da quietude do espírito e da mente limpa do intenso tráfego de pensamentos.

Há momentos em que me sinto sufocado pelo tempo em que vivo. Às vezes acho que isso é fruto do fantasma da nostalgia, que, cedo ou tarde, aparece para qualquer adulto pós-trinta. Noutras, acho que tem a ver com uma sensação de que realmente a vida antes era muito mais confortável, mesmo sem todas as tecnologias que nos tomam de assalto e, como um vício, nos tornam dependentes.

É natural que as crianças e os adolescentes dos dias atuais vejam na tecnologia suas principais referências de lazer e conhecimento. O problema é como fazem para tirar disso os aprendizados capazes de torná-los pessoas melhores em todos os sentidos; como fazem para desvincular a felicidade de suas aquisições tecnológicas e materiais.

Sinto (mais do que penso sobre...) que ser feliz está bem mais ligado à atenção que damos aos pequenos fragmentos de vida com os quais nos deparamos o tempo todo: um jantar a dois no sábado à noite; a companhia dos amigos para troca de planos e de boas risadas; o deleite de um bom filme; a leitura daquele livro que compramos, mas ainda não tivemos tempo de ler; uma viagem ao encontro do mar, das montanhas, da história...

Estou falando dos pequenos pedaços de felicidade, conquistados e lapidados tão-somente pela vida simples que realmente podemos escolher; por valores que jamais poderão ser comprados ou calculados em percentagem. Para se ter felicidade não é preciso de badalações, prêmios de reconhecimento social ou bens que impressionam os olhos. Ser feliz é muito mais fácil no anonimato, na simplicidade e no silêncio.

Roberto D’arte
(publicado no Jornal TRIBUNA LIVRE, Viçosa-MG, em 29 de junho de 2007)

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