sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Já nos acostumamos.


Na última semana do ano em curso ocorre a retrospectiva jornalística dos principais fatos ocorridos no mundo. No primeiro dia do ano novo comemora-se o Dia Mundial da Paz.

Confesso que desde o dia em que assisti Miss Simpatia passei a refletir sobre esse anseio popular. As candidatas a “Miss Estados Unidos” expressavam igual desejo de paz. Filme divertido, enredo envolvente, romance em dose salutar e, como pano de fundo, deixa transparecer uma verdade desconcertante: Paz Mundial não passa de discurso bonito e politicamente correto, sob medida para qualquer candidata a Miss.

Gosto de discursos. No curso de oratória aprende-se a conviver com eles e apreciá-los. Tive a oportunidade de ouvir oradores brilhantes, além de ler dezenas de discursos. Sem falar em tantos outros gravados em um CD do Reinaldo Polito, concorrente do meu mestre, o outro Reinaldo menos influente e igualmente bom, o Passadori. Claro que fiz os meus, afinal um curso de comunicação verbal objetiva ensinar a falar em público. Meia dúzia de técnicas de postura, exercícios vocais, diversas leituras, vários ensaios até que, num determinado dia, estamos de frente para um auditório e soltamos a voz num discurso sobre tema de interesse.

Por conhecer a técnica do discurso raramente creio na sinceridade dos bons oradores. E o que aquela personagem interpretada por Sandra Bullock e essas pinceladas de retórica têm a ver com o Dia Mundial da Paz? Ocorre que esta data me reporta aos discursos e desejos vazios. Em paralelo, recorda-me das normas programáticas inseridas na Constituição Federal Brasileira, qual a que alude a tudo aquilo que o salário mínimo deveria proporcionar ao trabalhador.

Paz Mundial? Quando? Onde? Como?

Para mim o primeiro dia de janeiro é apenas mais um conveniente feriado. Da guerra nas rodovias retornam os corpos a serem sepultados. Da batalha urbana extraem-se novos homicídios. Dos festejos populares sobressaem os feridos com fogos de artifício, os afogados nas ondas do mar, os bêbados que maltrataram seus familiares e amigos porquanto decidiram se embriagar para poderem assim agir.

Paz no mundo? Onde?

Andamos em carros que competem com outros pelas ruas da cidade, desejosos de obter uma mesma vaga mais à frente no caótico congestionamento. Nossos veículos excedem velocidade nas rodovias e trafegam pelos acostamentos. Ingressamos em transportes públicos lotados e não sabemos o nome de ninguém. Escondemo-nos nas nossas casas sem nos preocuparmos se nosso vizinho tem o que comer, se os seus filhos estão saudáveis, se não precisa desabafar com alguém, se não está se sentindo solitário numa data festiva como aquela. Caminhamos pela rua junto com dezenas de pessoas e só sabemos olhar feio quando um distraído perde o ritmo e, por acidente, pisa no nosso pé. Freqüentamos supermercados apinhados de clientes e não cumprimentamos a mocinha do caixa, achamos que é culpa dela a fila imensa ou a conta superior ao orçamento doméstico. Vivemos sendo agredidos e agredindo aos outros. Xingamos qualquer um que atrapalhe as nossas idéias. Maltratamos com olhares, palavras e escritos. Quando empregado, odiamos o patrão que nos faz trabalhar; quando empregador, nós detestamos pagar nossos funcionários porque fazem pouco por merecer o salário.

Paz mundial? De que jeito?

Será que antes de acreditarmos em discursos ideológicos, desejos impossíveis ou sonhos malucos, não seria mais útil mudarmos os nossos hábitos? É possível haver paz no planeta quando nem mesmo um único indivíduo consegue viver em paz com o seu semelhante?

A única paz na qual realmente creio é aquela que busco alcançar quando me deparo com um meu semelhante. Esta paz é possível e, se fosse compreendida por todos, evitaria as tantas guerras com as quais hoje convivemos.

(Este post é parte integrante da blogagem coletiva “PAZ NA TERRA”, proposta e coordenada pelo querido amigo Lino Resende. Visite-o e a todos os blogueiros linkados no seu post sobre o tema)

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